Um relato – Swim GP 10km

Após a marcação de uma segunda cirurgia ao tornozelo em 7 meses, cerca de 20 dias antes da prova, vi-me obrigada a desistir de participar no SwimGP 10 km. Só estava autorizada a voltar à água 10 dias antes da prova, insuficiente para treinar para uma prova desta dimensão.

Três dias antes do evento, num treino de águas abertas, a Bibiana desafiou-me a participar na mesma, sem pressão, e a encarar a travessia como preparação para a Faial-Pico. E lá fui eu.

Cheguei muito cedo no dia, passei algum tempo sozinha a olhar para o mar e, ao contrário do ano anterior, sem nevoeiro, o mar parecia relativamente calmo. Aos poucos começaram a chegar os companheiros de “profissão”. Estávamos todos um pouco nervosos, o que é normal perante o desafio que nos aguardava. Como habitual, dei um abraço de suporte à Mayra (provavelmente mais do que um).

Com ansiedade, mas sem pressão para terminar, comecei a prova. Nos primeiros metros encontrei uma nadadora sem fato térmico, com um ritmo calmo, e pensei: a este ritmo estou confortável, vou ficar aqui. Mas, ao aproximar-me da praia de Carcavelos, vi à frente um grupo, e reparei que uma das boias estava impecavelmente esticada e arrumada – reconheci de imediato que era a Mayra. Dei um extra na pernada e, passados alguns minutos, estava num lugar de conforto: atrás da Mayra, a aproveitar a boleia.

Não era a única com essa ideia. Tive de disputar o lugar com alguns colegas, porque seguir nos pés da Mayra é realmente privilegiado. Estávamos num grupo grande, mas com o contacto normal consegui garantir que aquele seria o meu lugar.

Em Carcavelos percebi, pelo ritmo e pelo facto de não sairmos dali durante mais de uma hora, que a corrente e o vento estavam contra nós. O mar estava agitado, mas ainda suportável. Havia a esperança de que as condições melhorassem a cada praia – mas isso nunca aconteceu.

No primeiro abastecimento mantivemo-nos no grupo, mas no segundo, já perto dos 5 km, ficámos apenas as duas. Eu sentia-me com energia (depois percebi que era o fim da bateria) e fui à frente durante uns metros, talvez 1 km. Depois trocámos e voltei na boleia da Mayra, mas quebrei por volta dos 7 km e não conseguia mais acompanhar. Nessa altura já nadávamos há mais de 3 horas.

No abastecimento fixo dos 7,5 km, a Mayra estava à minha espera e ajudou-me a alimentar-me – já enjoada de gel, mas consciente da sua importância, fiz o esforço. Encontrámos também o André Marquet, que seguiu na sua jornada. Até aí pensava que estávamos nos 6,5 km, mas recebi a feliz notícia de que faltavam apenas 2,5 km e que, teoricamente, iria tornar-se mais fácil, pois começaríamos a ficar mais protegidos.

Seguimos, mas ao fim de 100 m percebi que já não conseguia acompanhar o ritmo da Mayra. Os braços doíam-me intensamente e, apesar dos géis, isotónicos e água, sentia um vazio.

Até então nunca tinha equacionado desistir e, quando o pensamento surgiu, rejeitei-o de imediato. A 2 km do fim, numa prova de 10 km, desistir seria algo muito difícil de superar mentalmente. A prova que na partida não tinha pressão para acabar, deu uma reviravolta aos 8km.

Intercalei pernada com nado completo até avistar o Graham, que me perguntou se estava tudo bem. Nadei ao lado dele durante uns metros e depois consegui colocar mais algum ritmo e fazer os últimos 700 m sempre em nado completo lento, numa espécie de meditação. Psicologicamente foi duro ver tantos nadadores a ultrapassarem-me sem eu conseguir acompanhar, mas estava ainda mais decidida a terminar do que a deixar que isso me afetasse.

Não foi uma decisão irrefletida: sabia que tinha energia para acabar, mas só a conseguiria aceder pela persistência da mente, porque o corpo gritava NÃO. Claro que imaginar-me a desistir aos 9 km dava-me ainda mais força para continuar – orgulho.

Nos últimos 200 m, já a passar pelos barcos, os primeiros nadadores dos 20 km estavam a terminar. Bati na meta e comecei a arrastar-me para a praia… até que ouvi a Mayra gritar da areia: BORA! Ganhei um pouco mais de energia para que ela não tivesse de esperar 10 minutos por mim para percorrer 20 metros. Compreendi a pressa – já estávamos nesta “brincadeira” há quase 5 horas.

Só passadas algumas horas percebi verdadeiramente o que tinha feito: em condições adversas, sem treino ou preparação adequada, cumpri o objetivo.

Mas não sem consequências, o meu corpo e mente ficaram exaustos de tal forma que sentia-me doente – como se tivesse passado por um trauma, felizmente só durou cerca de 24h. Apercebi-me que o treino aqui também tem impacto, o treino é essencial até depois da prova. 

Nada disto teria acontecido sem o empurrão, o desafio e o acreditar da Bibiana em mim, sem o companheirismo da Mayra e de todos os nadadores pelo qual passei e falei durante os 10km. A comunidade das águas abertas é algo incrível e do que me orgulho de fazer parte.

Normalmente sou bastante dura comigo própria: penso que devia treinar mais, que podia dar mais nas provas, que a minha técnica é um desastre… Mas depois lembro-me de que aprendi a nadar há apenas 4 anos e que faço isto como hobby. Aprendi que é importante celebrar e ter orgulho das nossas conquistas, grandes ou pequenas, porque elas fazem parte do caminho. O importante é nunca deixar de acreditar e manter a persistência para superar obstáculos — na natação e na vida.

Joana Paz – 4H48mint

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